i(ntelligent)Speeches

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Dia 3 do iMed 6.0. Mais um dia, o último dia. O programa manteve-se interessante e diverso, com uma manhã inicialmente mais dedicada à Física, com uma palestra sobre Medicina Personalizada no tratamento do cancro pancreático e mais um evento competitivo, desta vez dedicado à investigação científica. À tarde, pudemos contar com as sonhadas iMed Sessions,  com a beleza do espaço e da música. A despedida fez-se com um sentimento de missão cumprida e notou-se, como seria de esperar, uma certa comoção no seio da comissão organizadora.

 

i(ntelligent)Speeches: a Máquina ao serviço do Homem

Embora já tenhamos evoluído da antissepsia de Semmelweis para a assepsia, os procedimentos cirúrgicos continuam a ser associados, pelo seu carácter classicamente invasivo, a complicações várias e infecciosas. Chega. Muitos dos fármacos de efeito sistémico afectam tecidos de forma difusa e provocam por isso efeitos adversos. Basta. A manhã deste último dia do iMed 6.0 começou então com a palestra do ambicioso Dr. James Choi, que, com a sua receita de ultrassons e microbolhas, pretende direccionar fármacos contra tipos de células precisos, tais como os neurónios do hipocampo ou as células endoteliais vítimas da agressão aterosclerótica.

O dinâmico James Choi (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)
O dinâmico James Choi (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)

O segundo orador da sessão “Man & Machine”, o muito sério Dr. Zoltán Takáts, focou-se mais no problema temporal da cirurgia oncológica, no tempo que decorre entre a recolha intra-operatória de tecido para estudo histopatológico e a chegada do veredicto do patologista. Apresentou o público à sua iKnife, um instrumento cirúrgico que corta tecidos e lhes aspira uma pequena amostra, dissociando-a em partículas que são imediatamente analisadas recorrendo à espectrofotometria. 0,7 a 2,5 segundos depois, ficamos a saber se estamos a fazer incisões em tecido normal ou neoplásico! Talk about real-time diagnosis…

O bisturi mágico de Zoltán Takáts (fotografia: Luís Rodrigues/Pedro Monteiro Palma)
O bisturi mágico de Zoltán Takáts (fotografia: Luís Rodrigues/Pedro Monteiro Palma)

Acabou a sessão falando do iEndoscope, que fará também, espera-se, o diagnóstico de uma neoplasia Do tubo gastro-intestinal em poucos segundos

“An ounce of prevention is worth a pound of cure”

Bem-vindo de novo, Professor Brunicardi! Pela segunda vez neste congresso, o nosso estimado e carismático cirurgião também artista subiu ao palco para falar, mas desta vez sobre Medicina Personalizada.

O sempre expressivo Charles Brunicardi (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)
O sempre expressivo Charles Brunicardi (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)

De novo contou a história, tal como fez no ano anterior, de Mendel e das suas ervilhas, da descoberta do ADN (explicando sempre por que razão Rosalind Franklin não recebeu o prémio Nobel), da sequenciação do genoma humano e da Medicina Personalizada. Claro que o caso da nova Dama Jolie veio mais uma vez à superfície, mas não foi o único. Voltou-se a falar do PDX-1 e de como poderá, num futuro mais ou menos próximo, actuar na prevenção das neoplasias do pâncreas.

Os conselhos de Stella Hurtley

A Fundação Astrazeneca patrocinou mais uma vez a Innovate Competition (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)
A Fundação Astrazeneca patrocinou mais uma vez a Innovate Competition (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)

Só 5% dos manucritos submetidos à revista Science são aceites, mas note-se (como ela realçou) que “os artigos são revistos por pessoas reais”, e não por seres insensíveis, portanto. Muitas são as razões que levam à rejeição de artigos e alguns são os truques que se pode usar para combater esta estatística desanimadora. Primeiro, treinar: treinar, treinar, treinar. Aprender a escrever bem e de forma inteligível para todos (especialistas da área, outros cientistas, media…). Foi uma apresentação sem dúvida extremamente útil e interessante para muitos, em particular para os investigadores que participaram na Fundação Astrazeneca – Innovate Competition, que contou com apresentações tão variadas quanto era possível, nos domínios da investigação básica e translacional. Falou-se de β-talassémia, de DPOC, de dengue, de síndrome metabólica… entre outros temas.

“Choose a job you love and you won’t have to work a day in your life.”

Há que deixar escritas umas palavras quanto ao sucesso das inspiradoras iMed Sessions. Começou-se com uma viagem ao espaço. “Queridos estudantes!”, talvez um dia possamos sentir na pele o que é a falta de pressão hidrostática e a incapacidade de realizar movimentos parabólicos. Francesco Torchia trouxe imagens raras de paisagens espaciais e de momentos na vida quotidiana de um astronauta em missão. Imagens tão originais, diferentes e estranhas para os comuns seres terrestres que quase nos surpreendeu ao falar em monotonia física e social. Mesmo perante todos os riscos psicológicos e físicos (sobretudo para os sistemas cardiovascular e músculo-esquelético), terá muito provavelmente ficado no público uma vontade de viajar para o espaço. Para quando, os voos comerciais para todos?

Francesc "o astronauta" Torchia antevê o futuro da fisiologia humana no espaço (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)
Francesco “o astronauta” Torchia antevê o futuro da fisiologia humana no espaço (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues)

Obrigada, Jessica Grahn. Não é todos os dias que se ouve uma oradora completa: energética, carismática, simpática, interessante e apaixonada pelo que faz. Foi difícil conter o riso indiscreto face às patadas rítmicas de Snowball ao som de Backstreet Boys. Também não é todos os dias que se ouve a palavra groove aplicada num projecto de investigação científica. Falou-se de música, de ritmo, e de como estes dois afectam o nosso sistema nervoso central e estimulam as nossas áreas motoras. Teremos aqui uma terapêutica adjuvante para doenças cerebrovasculares e neurodegenerativas? Veremos. O que se sabe é que o público entrou em êxtase perante a perspectiva e ficou entusiasmado com este final de congresso.

«Música, Maestro», parece dizer Jessica Grahn (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luis Rodrigues)
«Música, Maestro», parece dizer Jessica Grahn (fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luis Rodrigues)

Cerimónia de encerramento?

Mas, antes da entrega dos prémios e dos discursos finais por vezes pontuados pelo tremelicar do nervosismo, reservaram-nos uma última, densa e pesada sessão sobre oncologia pediátrica, que foi uma surpresa para quem esperava uma cerimónia de encerramento ligeira. Leucemia linfoblástica aguda (LLA) foi o tema explorado pela Dra. Shannon Maude e muitos foram os alunos que não seguiram o fio condutor da apresentação. Considerando que as células neoplásicas são células que de algum modo escaparam ao reconhecimento pelo sistema imunitário, a Dra. Maude centra esforços na busca de um fármaco que, além de ter grande especificidade para a população pediátrica, tenha grande especificidade para linfócitos. O que propõe é uma forma de levar linfócitos T citotóxicos a expressar à superfície um receptor que não existe na natureza, o Chimeric Antigen Receptor, que reconhece exclusivamente o antigénio CD19 presente nas células deste tipo de tumor hematopoiético. Espera, assim, conseguir desenvolver uma imunoterapia eficaz e capaz de fazer sorrir as crianças (e as famílias) vítimas da LLA.

fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues
fotografia: Pedro Monteiro Palma/Luís Rodrigues

A cerimónia de encerramento propriamente dita que se seguiu a esta última palestra foi marcada pelo anúncio dos vencedores da Innovate Competition e pelos discursos da Presidente da AEFCML Teresa Nóbrega e da Presidente do Congresso iMed 6.0 Catarina Palma dos Reis, que discursou com uma calma e uma serenidade que nunca deixariam antever a fonte de preocupação e de stress que é organizar um evento desta dimensão.

E no fim dos três dias, o que ficou?

Ao longo destas seis edições, o iMed foi marcando, a passos largos, o seu lugar no mundo das conferências. Perdeu o seu estatuto de conferência “de faculdade”, familiar e acolhedora, para invadir o território nacional e internacional. Cresceu, revolucionou-se e apresentou-se agora, seis anos volvidos, orgulhosa e triunfante perante a comunidade científica.

Usando a velha máxima, a iMed Conference foi fruto de sangue, suor e lágrimas. Este esforço culminou num desfile de mentes brilhantes, que decidiram dar o seu contributo para um crescimento intelectual colectivo através de palestras interactivas e, sobretudo, humanas.

E, respondendo à questão inicialmente colocada no website do iMed – “What is Science?”, a ciência é isto.

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Inês Pereira tem 24 anos, é natural de Cascais e frequentou a FCM/NMS de 2010 a 2016. Mas, antes de enveredar pela via da Medicina, deambulou durante quinze anos pelo Liceu Francês Charles Lepierre de Lisboa, onde adquiriu um gosto particular pelas línguas. Fala fluentemente português, francês, inglês e alemão (quase...). Se lhe perguntarem que língua nova se segue, ela, muito aflita, vos dirá que ainda não sabe, que ainda não se decidiu. Italiano, polaco, grego, russo, árabe...? Enquanto não opta por um (ou dois...) partido(s) linguístico(s), vai lendo, ouvindo muita música e percorrendo os festivais de cinema que puder. A Mente no seu suporte cerebral e a Filosofia são duas paixões desta pequena cabeça, narcisicamente enamorada pelo Ser Humano.

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