Novo ano, velhos desafios

Pontapé de saída para o espaço de opinião da FRONTAL, com a crónica de João Pedro Vieira. A partir de hoje, todos os sábados, um novo artigo para dar nova luz aos grandes temas em discussão pelos médicos do futuro. 
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[Opinião]

[dropcap]1.[/dropcap] Ao tempo em que inicio a minha participação neste espaço de opinião – parte integrante do renovado projeto da Revista Frontal, cuja existência saúdo e a cujos responsáveis agradeço a amabilidade do convite e endereço felicitações pelo trabalho desenvolvido -, ingressam nas universidades portuguesas dezenas de milhares de estudantes, entre os quais sensivelmente 1600 novos estudantes do Curso de Medicina, espalhados um pouco por todo o país. Estou certo de que todos recordamos com saudade esse nosso momento, motivo pelo qual deixo aos novos alunos uma saudação especial por fazerem parte deste extraordinário momento de renovação do Ensino Superior em geral e da Medicina em particular.

Os desafios que se colocam aos novos estudantes das Escolas Médicas são em grande medida idênticos aos que enfrentámos até aqui. Feliz e infelizmente: se por um lado essa constituiu prova inegável dos padrões de exigência, trabalho e motivação que se mantêm e que caracterizam quem escolhe este caminho, por outro é igualmente evidência de que muitos dos problemas e dificuldades que as Escolas Médicas enfrentam se mantêm, pese embora em alguns casos devidamente identificados há alguns anos. O final de ciclo para uns e o início para outros é de resto uma marca temporal que, mantidas determinadas circunstâncias de ensino e aprendizagem, revela as dificuldades de implementação de novas respostas, local e nacionalmente, que visem o progresso da Educação Medica pré e pós-graduada.

O final de ciclo para uns e o início para outros é uma marca temporal que, revela as dificuldades de implementação de novas respostas, local e nacionalmente, que visem o progresso da Educação Medica pré e pós-graduada.

As Escolas Médicas enfrentam – porventura enfrentarão sempre – dificuldades geradas pelas circunstâncias externas do meio – politico, económico e social – onde se insere a sua atividade e que exigem sobretudo respostas sistemáticas devidamente enquadradas numa estratégia comum de médio e longo prazo. E que, pese embora o seu reduzido espaço de intervenção, merecem a máxima atenção dos estudantes. À semelhança do que deve acontecer com as dificuldades de origem interna, resultado de falências organizacionais e metodológicas e que exigem uma capacidade de promoção de reflexão e intervenção conjunta e alargada, devendo todos os estudantes, os que estão de saída e os que agora chegam, constituir um veículo fundamental de promoção da mudança e da adaptação necessária. O potencial de desenvolvimento das Escolas Medicas nem sempre tem sido capaz de acompanhar o ritmo de crescimento verificado e, com ele, a necessária correção de trajetórias para que se mantenham os níveis de excelência onde foram atingidos e para que se melhorem os índices formativos onde as falhas estão identificadas.

A cada ano que passa renova-se o corpo estudantil e devem por isso renovar-se igualmente os atores, as ideias e as estratégias de ação, nomeadamente do corpo educativo e respetivos órgãos, para que as políticas educativas, internas e externas às Escolas Médicas, sejam o garante da satisfação das expectativas, ambições e necessidades dos atuais estudantes e futuros médicos do país.

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[dropcap]2. [/dropcap]Passaram exatamente seis meses desde que as Associações de Estudantes, nomeadamente através da ANEM e de ações locais, discutiram com os estudantes as questões relacionadas com a formação pós-graduada, a propósito da proposta de projeto-lei apresentada pelo Ministério da Saúde. Sobre essa matéria partilho uma curta nota de preocupação: se por um lado as Escolas Médicas têm o dever de promover as reformas internas promotoras do seu sucesso, por outro é fundamental que os estudantes, enquanto principais interessados na matéria, não deixem para depois, eventualmente para demasiado tarde, o acompanhamento contínuo, a discussão conjunta e a consciencialização de todos relativamente às questões fundamentais sobre a sua formação e o exercício da sua atividade – por mais distante, no espaço e no tempo, que essa realidade pareça estar. Julgo ser importante recordá-lo neste regresso à atividade para que todos saibamos, agora e sempre, com que linhas se suturará o nosso futuro.

É fundamental que os estudantes, enquanto principais interessados na matéria, não deixem para depois, eventualmente para demasiado tarde, o acompanhamento contínuo das  questões relacionadas com a formação pós-graduada.

A capacidade de adaptação às circunstâncias que marcarão a nossa prática deve ser acompanhada da necessária reflexão e discussão atual sobre as matérias envolvidas, promovidas pelas AAEE, sob pena de, quando se regressar ao assunto, ser demasiado tarde para tomadas de posição conscientes e coerentes com uma visão conjunta e estratégia de médio e longo prazo para a Educação Médica, para o exercício da Medicina e para a Saúde em Portugal. Para que de uma vez por todas se defina um rumo – que implicará cedências de todas as partes – que corresponda ao melhor possível para todos: estudantes, médicos, Sistema Nacional de Saúde e população portuguesa. Envolver todos no tempo certo é a melhor forma de contribuir para a mudança certa e não para a inevitável.

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[dropcap]3.[/dropcap] Uma última nota dedicada aos 35 anos que o Sistema Nacional de Saúde assinalou esta semana: a herança que recebemos é grande e merece por isso o carinho, o respeito, o empenho e a responsabilidade de todos na defesa do seu legado histórico e na construção do seu futuro. Por isso mesmo, tal como às Escolas Médicas e tal como aos estudantes, exige-se a todos os agentes que com ele se relacionam a capacidade de trabalho necessária para à adaptação a novas realidades que nos são impostas sobrepor-se sempre, em qualquer momento e em qualquer circunstância, a intransigente defesa do direito à Saúde da população portuguesa. Prossiga-se!

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Aluno do 6º ano do Mestrado Integrado em Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, Vice-Presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa. Foi membro discente do Conselho Pedagógico da FMUL entre Dezembro de 2012 e Maio de 2014 e procura acompanhar ativamente o dia-a-dia da Faculdade e da Associação de Estudantes local.

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