A Enigmática Ciência da Cozinha

A época natalícia é, sem sombra de dúvida, indissociável de muita e variada comida à mesa. Passa-se, portanto, muito mais tempo na cozinha do que o habitual, isto porque o número de bocas a alimentar é, também, maior. E, certamente, todos aqueles que cozinham já terão sido confrontados, mais do que uma vez, com duas grandes dúvidas: a primeira é o porquê de chorarmos ao cortar uma cebola e a segunda é o potencial cancerígeno das torradas e carnes queimadas. Também queres ficar esclarecido de vez? A FRONTAL elucida-te.

 

É de cortar e chorar por mais!

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As cebolas, tão frequentemente utilizadas na cozinha, possuem, entre tantos outros, um componente S-l-propenilcisteína-sulfóxido. Este composto liberta-se, por ação de um enzima, aquando do corte da cebola, originando um volátil óxido de propanotial-S, o agente irritante. Este agente, quando em contacto com a água – constituinte do corrimento lacrimal que reveste os nossos olhos – hidrolisa-se e forma propanol, ácido sulfúrico e sulfureto de hidrogénio. A lágrima funciona, portanto, como uma forma de proteção do organismo com vista a eliminar o excesso deste ácido.

Poderíamos pensar que este é um inconveniente supérfluo, mas a sua importância no mundo da culinária é tal que levou a que, em 2008, um grupo de cientistas da Nova Zelândia e do Japão criassem uma cebola modificada geneticamente que, por isso, não originava qualquer lágrima quando era cortada. Este grupo de cientistas reconheceu, no entanto, que o sabor da cebola poderia ser afetado pela alteração da sua composição genética, mas mantêm a esperança de que o mesmo possa ser melhorado numa fase posterior da investigação.

Apesar da expectativa que esta inovação possa criar no público, a maioria dos cozinheiros terá de esperar entre 10 a 15 anos para poder picar cebolas sem chorar, preveniram os cientistas.

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Assim, até lá, aqui ficam técnicas, não comprovadas cientificamente, para evitar o lacrimejo:

1) Afastar o mais possível a cebola cortada dos olhos: o melhor será cortá-la com os braços esticados, evitando estar dobrado sobre a cebola enquanto a mesma está a ser cortada. Se o fizeres com a cebola debaixo de água corrente, melhor ainda!


2) Respirar pela boca. Assim, em vez de criar uma corrente de ar que sobe pelo nariz e atinge impreterivelmente os olhos transportando o agente irritante, o ar é canalizado diretamente para os pulmões.

3) Outras técnicas populares incluem usar lentes de contacto, mastigar pão, colocar uma rodela de limão por baixo do lábio superior ou ainda segurar um cubo de açúcar entre os dentes.

No estorricado é que está o cancro?

Desde há algum tempo que se sabe que os alimentos excessivamente aquecidos ou cozinhados podem originar alguns compostos associados a cancro, como aminas heterocíclicas ou os chamados hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAHs).

No caso das torradas queimadas, a maior preocupação envolve o risco de formação de acrilamida, um composto que tem sido associado a danos nervosos e cancro em animais.

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Em 2006, um estudo apresentado na Associação Americana para Pesquisa do Cancro revelou que os produtos químicos da carne carbonizada aumentam o risco de carcinoma da próstata em ratos. Um estudo de 2009, da mesma Associação, associa o carcinoma do pâncreas ao consumo de carne bem-passada. Outros estudos têm apontado para uma duplicação do risco de cancro do ovário e cancro do útero entre as mulheres que ingerem aquele composto em alimentos.

No entanto, é preciso destacar que a ligação direta entre o cancro e a acrilamida nos alimentos consumidos pelo ser humano está longe de ser convincente.

Em 2007, a intuito de prevenção, os conselheiros de saúde da União Europeia decidiram tomar medidas de precaução e recomendaram que as pessoas evitassem comer torradas queimadas pois poderiam conter níveis inaceitavelmente altos de acrilamida. Por isso, não arrisques: faz churrascos com moderação!

Estes são apenas alguns dos vários enigmas científicos no mundo da culinária. Ficaste com curiosidade de conhecer mais? Está atento à FRONTAL!

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Ana Rute Marques é aluna do 5º ano da FCM-NOVA. Nascida em Lisboa, cresce em Corroios. Ingressa no ensino superior em 2009, na Faculdade de Ciências Médicas, no mestrado integrado de Medicina. É colaboradora da Revista FRONTAL desde o início de 2013. Os seus interesses pessoais, além da Ciência (em especial das Neurociências), abrangem o Mundo Animal, a 7ª arte, as técnicas de Defesa Pessoal e os Clássicos da Literatura Portuguesa.

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