A Medicina Filosófica e Energética do outro lado do mundo

A ciência comprovou a eficácia da acupunctura, uma técnica integrada na Medicina Tradicional Chinesa a qual, por sua vez, é uma medicina com características diferentes da Ocidental. Mas quais são os seus alicerces? Para compreender esta medicina dita alternativa, há que entender que se fundamenta em conceitos filosóficos e energéticos, com o objectivo de promover a saúde e o equilíbrio do organismo.

Science, as our narrative describing what we see and what we conjecture exists in the natural world, is thus necessarily limited, telling only part of the story… We strive toward knowledge, always more knowledge, but must understand that we are, and will remain, surrounded by mystery…

Marcelo Gleiser, in A Ilha do Conhecimento

Chinese-Herbs

O primeiro conceito é o Qi, a substância vital predominante, que pode ser definida como a energia adquirida geneticamente e com origem nos nutrientes ingeridos, apresentando manifestações físicas e espirituais. Esta energia, relaciona-se com as restantes substâncias vitais (Essência ou Jing, Sangue ou Xue, Fluidos Orgânicos ou Jin Ye) através de uma interdependência, isto é, o Qi manifesta-se através delas e mantem-nas, ao mesmo tempo que é nutrido por elas. A sua circulação processa-se, à semelhança da rede vascular ou linfática, por um circuito fechado de vasos conhecidos por meridianos.

taiji01Relacionado com estes conceitos, existe também a noção de Yin/Yang, representada pelo conhecido símbolo Tai Ji, através do qual se desdobra o significado de dois termos aparentemente contraditórios, mas que se complementam. São duas fases interdependentes de um ciclo, transformando-se um no outro, com o objectivo de alcançar um equilíbrio. Daqui depreende-se que, um desequilíbrio por consumo excessivo ou défice de um deles, resulte em doença.

O Yin e o Yang reflectem-se no corpo humano consoante as suas características e, de uma forma genérica, podem ser organizados da seguinte forma:

  • Nas costas fluem os meridianos Yang como forma de proteger o corpo do exterior e convergindo na cabeça;
  • À frente, fluem os meridianos Yin que nutrem o organismo;
  • As 6 vísceras Yang são ocas e incluem a vesícula biliar, o intestino grosso e delgado, o estômago, a bexiga e o triplo aquecedor (estrutura energética responsável pelo metabolismo e não reconhecida no Ocidente);
  • Os 5 órgãos Yin, sólidos, englobam o fígado, o coração, os pulmões, os rins e o baço/pâncreas.
A Influência do Yin e Yang nos órgãos humanos (retirado de Beijing Digital Museum of TCM)

Com base nestes conceitos, surgem duas teorias que sustentam a Medicina Tradicional Chinesa: são elas a Teoria dos 5 Elementos e a Teoria dos 12 Sistemas Internos. A primeira dá-nos uma compreensão íntima dos fenómenos naturais através de 5 movimentos – Madeira, Metal, Água, Fogo e Terra -, ou seja, traduz-se na influência da Natureza no corpo humano e de como as dimensões do organismo se repercutem umas nas outras, incluindo o emparelhando e a influência cíclica dos órgãos Yin e das vísceras Yang (como o fígado e a vesícula biliar). Na segunda teoria, compreende-se que esses órgãos e vísceras são os responsáveis pela síntese e manutenção das substâncias vitais, não só representados anatomicamente, como também através da sua relação com os tecidos, as actividades mentais, o clima e mesmo as emoções.

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Como em qualquer medicina, na presença de uma patologia, há que proceder à colheita da tão importante história clínica. A Medicina Tradicional Chinesa não é excepção e realiza-a de forma muita semelhante à Medicina Ocidental, através da anamnese com revisão de órgãos e sistemas e do exame objectivo. Neste último, procede-se a uma avaliação detalhada do doente, que passa pela observação do exterior, da constituição do indivíduo, do estado mental e emocional, das várias sensações objectivas e subjectivas dos Meridianos e pela palpação. As diferenças assentam essencialmente na maior importância dada a determinados elementos, especialmente: a língua, pela sua cor, forma, humidade e topografia; o pulso, com múltiplas classificações em concordância com a percepção do médico e que reflecte os Sistemas Internos, o Qi e o Sangue.

A marcha diagnóstica continua, com a identificação de padrões de sinais e sintomas correspondentes a uma patologia e que reflectem uma desarmonia seja ao nível dos Sistemas Internos, dos Meridianos ou em ambos. Vale a pena referir que estes dois elementos formam uma unidade, apesar de energeticamente separados, podendo, assim, afectar-se mutuamente.

Prosseguimos para a terapêutica, com a ideia de que o corpo tem as ferramentas necessárias para se curar. O princípio amplamente utilizado é o da Raiz (a patologia) e da Manifestação (clínica), mais uma vez, dois aspectos da mesma realidade que permitem aplicar uma terapêutica dirigida. Como na Medicina Ocidental, há contextos que implicam apenas o tratamento da raiz, mas outros que requerem uma abordagem dirigida também aos sintomas. No fundo, o tratamento passa por tonificar (numa insuficiência), dispersar (quando há excesso) e regularizar o Qi e os órgãos, eliminar factores prejudiciais de origem externa e/ou interna (frio, calor, vento, secura, humidade e calor de verão) e restituir o equilíbrio. O cumprimento destes objectivos, passa pela aplicação das seguintes técnicas:

  • Acupunctura: consiste na punção por agulhas filiformes estéreis e descartáveis em pontos específicos do sistema de Meridianos, com o objectivo de direccionar o Qi para a lesão e repor a circulação de energia. Actualmente, é o único método reconhecido pela Organização Mundial de Saúde.
  • Fitoterapia: conhecida como a terapia natural através das plantas, com um carácter essencialmente empírico mas onde a investigação científica está cada vez mais patente. Existem várias fórmulas fitoterápicas chinesas, nas quais se usam seis ou mais plantas com capacidades e interacções conhecidas, evitando efeitos adversos e promovendo a chegada dos agentes ao local da doença. Desta forma, o médico e especialista nesta área, pode alterar a fórmula de maneira a adaptá-la ao caso do doente.
  • Tui Na: corresponde a massagens vigorosas que proporcionam um relaxamento muscular e a condução do Qi nos meridianos, com restauração do equilíbrio energético e regulação das funções dos órgãos e sistemas nervoso e endócrino.
  • Ventosaterapia: a colocação da ventosa pressupõe uma sucção através da utilização de uma substância cadente dentro da mesma. A sua aplicação consiste na remoção das substâncias tóxicas do sangue e evicção da sua estagnação, para alívio de dores musculares, lombalgias e melhoramento do sistema circulatório. Pode ainda ser direccionada para a massagem, com prévia lubrificação de superfícies lisas do corpo (costas e coxas), promovendo o fluxo do sistema linfático, reduzir o edema, remover adesões e fibrosos e activar a circulação energética.
  • Moxabustão: esta técnica é semelhante à acupunctura por se basear nos mesmos conhecimentos acerca dos meridianos. No entanto, a estimulação dos pontos e a circulação do Qi são conseguidas através do calor, pela combustão das ervas Artemísia sinensis e Artemísia vulgaris (moxa), as quais têm igualmente propriedades anti-inflamatórias. No método directo, a moxa é colocada sobre a pele e amassada em cones pequenos que não se desfazem. Já no método indirecto, o pó das plantas é enrolado num papel próprio formando “charutos” de 15 cm, cuja extremidade acesa irá permitir aquecer pontos e áreas do corpo específicos. Para aquecer áreas maiores, existe a moxa acesa, em que esta é colocada num instrumento com fundo de rede que possibilita a transmissão do calor para a pele sem que haja contacto com a mesma.

Através desta breve introdução à Medicina Tradicional Chinesa, podemos ver que está envolta numa complexidade maior do que à primeira vista faz crer.

Observa o organismo humano em todas as suas variantes (mental, espiritual, orgânica, ambiental, genética, dietética), vendo-o como um todo e englobando a ressonância que a Natureza exerce nele. Concluímos que o fim médico, tanto do Oriente como do Ocidente, é o mesmo, apenas atingido por meios diferentes. Propõe-se como próximo passo, a complementaridade, uma união de duas medicinas para um bem comum.

Se quiseres saber mais sobre a Medicina Chinesa...
Maciocia, G. “Fundamentos da Medicina Chinesa”. Editora Roca. 1996

http://www.medicinachinesapt.com

http://www.tcmworld.org

Imagens retiradas de:

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