Cancro por vírus da Hepatite D – Um Segredo Desvendado

A existência de uma associação entre a infecção crónica com vírus da hepatite D (VHD) e o carcinoma hepatocelular, através da identificação de um mecanismo envolvido na replicação do VHD que potencia o desenvolvimento de células cancerígenas é revelada num estudo de que é co-autor Celso Cunha, da Unidade de Ensino e Investigação de Microbiologia Médica do Instituto de Higiene e Medicina Tropical. A FRONTAL foi averiguar os mecanismos em causa.

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O RNA-Vírus da Hepatite D (ou Delta), descoberto em 1977, possui uma capacidade única relativamente aos restantes vírus da Hepatite: utiliza o seu próprio genoma como enzima que cliva os produtos da sua transcrição, permitindo a sua proliferação. Porém, devido à limitada produção de outras proteínas pelo VHD necessárias à sua replicação, este apenas se pode multiplicar na presença da infeção pelo vírus da hepatite B (VHB). Por isso, as formas de transmissão do VHD são as mesmas do VHB, nomeadamente sangue, transfusões sanguíneas, parto, partilha de seringas infetadas ou objetos de higiene pessoal, havendo uma maior prevalência deste vírus na bacia mediterrânica, Médio Oriente, Ásia Central e África Ocidental.

A infeção por VHD pode ocorrer como co-infecção – simultaneamente com o VHB – ou como superinfecção – portador crônico da hepatite B que se infecta com o VHD – possuindo esta última pior prognóstico.

Um estudo recente, que será brevemente publicado na edição de agosto do Journal of Proteomics, da co-autoria de Celso Cunha, da Unidade de Ensino e Investigação de Microbiologia Médica do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT), revela qual o mecanismo subjacente à replicação do VHD que potencia o desenvolvimento de células cancerígenas responsáveis pelo carcinoma hepatocelular.

Através da abordagem proteómica desta investigação, foram reveladas as alterações na replicação dos genes da célula que resultam da multiplicação viral do VHD. Este vírus altera um dos mais relevantes pontos de controlo do ciclo celular: o que se situa entre a fase G2 e M, levando a erros com graves repercussões celulares. Deste estudo, destaca-se ainda uma outra descoberta: o VHD possui a capacidade de diminuir a síntese proteica responsável pela morte celular, o que prolonga a vida da célula potenciando a ocorrência de erros genéticos que poderão originar carcinoma. Deduz-se assim que, através do controlo das consequências genéticas celulares devidas ao VHD, se possa prevenir o surgimento de carcinoma hepatocelular.

Embora em Portugal a prevalência da infeção por VHD seja rara supõe-se que existam cerca de 15 mil portadores crónicos no país. A partir desta investigação, pretende-se, no futuro, a criação de terapêuticas celulares específicas e universais que permitam o impedimento do processo de desenvolvimento de carcinoma hepatocelular em doentes com VHD.

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Ana Rute Marques é aluna do 5º ano da FCM-NOVA. Nascida em Lisboa, cresce em Corroios. Ingressa no ensino superior em 2009, na Faculdade de Ciências Médicas, no mestrado integrado de Medicina. É colaboradora da Revista FRONTAL desde o início de 2013. Os seus interesses pessoais, além da Ciência (em especial das Neurociências), abrangem o Mundo Animal, a 7ª arte, as técnicas de Defesa Pessoal e os Clássicos da Literatura Portuguesa.

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