Reforma Curricular: A Avaliação

StatsA integração do novo programa curricular na vivência da FCM-NOVA não tem sido, objetivamente, pacífica. De facto, e em inúmeros momentos, tem sido aparente o desconforto dos estudantes que se encontram sob a égide da “Nova Reforma” no que toca a questões de organização e metodologia, mas também de comunicação entre docentes e discentes.

Foi neste contexto que a FRONTAL e o departamento de Educação Médica da AEFCML sentiram a necessidade de objetivar, por via de inquérito directo, a opinião dos alunos do 1º e 2º anos (no ano letivo 2012/2013) em relação à sua experiência com a nova realidade pedagógica que foi introduzida na Faculdade de Ciências Médicas. Os resultados deste inquérito serão apresentados oportunamente em sede de Conselho Pedagógico e de Comissão de Acompanhamento do Novo Currículo (espécie de think tank criado pela actual Direção da faculdade, composta por representantes de docentes e alunos, que procura analisar problemas e propor soluções no que toca a esta temática) para que possam ser aí discutidos, procurando-se soluções para eventuais dificuldades apontadas pelos alunos.

Em qualquer reforma estrutural que se preze geram-se múltiplos confrontos de visões opostas. Muitas vezes esses confrontos são intempestivos e pouco fundamentados. Em outras ocasiões o argumento de uma das partes intervenientes é ignorado pelas restantes. Na verdade não há nada como a dura frieza da estatística para constatar o “estado de alma” de um grupo de indivíduos inteligentes e conscientes, como o são os estudantes da FCM-NOVA.

Os Resultados

Foram distribuídos e analisados um total de 384 inquéritos durante o mês de maio de 2013. Recolhemos 218 preenchidos por alunos do 1º ano e 166 do 2º ano – o que corresponde, respetivamente, a 82% e 66% do universo de alunos destes anos lectivos. Apresentamo-vos os principais resultados: aqueles cujo conhecimento, no nosso entender, permite não só informar com objectividade os leitores da FRONTAL, mas também dar uma nova perspetiva a este polémico assunto.

Com o objetivo de facilitar a leitura do artigo foi decidido simplificar uma série de elementos. Por exemplo: arredondamos os valores às unidades, não apresentamos os resultados das opcionais e só destacamos a proporção de alunos que não responderam a dada questão quando tal for relevante.

Inquérito Frontal 007

Tempo Dedicado ao Estudo

No que toca ao 1º ano – respeitando a antiga tradição da FCM-NOVA – verificamos que Anatomia continua a ser a Unidade Curricular (UC) “mais popular”. De facto, 70% dos alunos inquiridos afirmam dedicar a esta disciplina “quase todo o tempo” do seu estudo. Quando concretizam o número de horas semanais alocadas a esta disciplina verificamos um valor médio de quase 16h/semana – ainda que o desvio-padrão se aproxime de um revelador valor de ±10h e a moda seja de 10h/semana (de ressalvar também que apenas 50% dos alunos quantificaram as horas de estudo). Verificamos que quase 75% destes alunos consideram que o tempo disponibilizado para esta UC não é suficiente, tendo em conta o que lhes é exigido (dando nesta questão uma nota negativa a Anatomia – 1 ou 2 numa escala de 1 a 4). Quanto aos restantes dados, destacamos o facto de Introdução à Medicina, no 1º semestre, e Genética, no 2º semestre, serem as UC com valores mais baixos de estudo médio semanal (moda de 1h/semana para ambas).

No 2º ano, o único destaque relevante, e que chocará qualquer estudante do “velho currículo”, é o facto de Farmacologia ser a UC menos estudada – 55% dos alunos dedicam-lhe “muito pouco tempo”, com uma média de pouco mais de 2h/semana. Há que ter em conta, no entanto, que os conteúdos da antiga disciplina estão agora distribuídos por outras UC como Fisiopatologia e Alvos Terapêuticos I e II e que são estas as disciplinas mais estudadas, tanto no 1º como no 2º semestre pelos alunos do 2º ano (aproximadamente 8h/semana).

Objetivos de Aprendizagem

Para 85% dos alunos do 1º ano os objetivos de aprendizagem (OA) das suas UC são claros e explícitos. Isto se retirarmos da equação a Genética (onde o valor desce para 41%) e Tecidos, Células, Moléculas [TCM] (com 61%). Ainda assim, nestas UC, o número de alunos que afirma conhecer os OA é superior aos que os dizem desconhecê-los (41 vs. 39% e 61 vs. 30%, para cada uma).

Passa-se que no 2º ano os valores são muito inferiores. 79% afirmam que os objetivos de Imagiologia e Anatomia Clínica [IAC] são pouco claros. Segue-se Anatomia Patológica com 58% e Fundamentos de Neurociências [FN] com 51%.

É quando chegamos à questão seguinte, “Com que frequência te deparas com o facto de teres de compreender conceitos que requerem outros conhecimentos que ainda não foram abordados (pré-requisitos)?” que começa a tomar forma o “martírio” da Anatomia Patológica [AP] (2º ano). Vejamos: neste ano letivo todas as UC recebem nota “positiva”, de 1 ou 2 nesta questão (numa escala crescente de 1 a 4), excepto AP. Apenas 5,4% dos inquiridos dão nota positiva a AP e aproximadamente 90% declaram que frequentemente lhes são requisitados conteúdos que nunca foram abordados. Este resultado é revelador, tendo em conta que nesta questão a 2ª UC a receber nota negativa conta com apenas 53% de alunos críticos.

No 1º ano destacamos a crítica às UC de TCM, Nutrição e Metabolismo [NM] e Genética onde a moda de classificação é de 3 – são precisamente estas as disciplinas com conteúdos científicos mais alienígenas, isto é, mais abstractos e desconhecidos.

Inquérito Frontal 026

Comunicação

No que toca à disponibilidade dos docentes para esclarecimento de dúvidas relacionadas com a matéria, métodos de avaliação, metodologias de estudo, etc., quase todas as UC recebem nota positiva por parte dos alunos. Destacamos Fisiologia no 1º ano e FAT I e II no 2º como as UC onde os docentes têm maior disponibilidade para os alu
nos. A única exceção a este paradigma situa-se no 2º ano e é, novamente, AP. 55% dos alunos dão nota negativa à disponibilidade dos docentes desta UC (a seguinte tem apenas 35%), sendo que é a única com nota negativa nesta questão (moda 2 e média 2,36 numa escala crescente de 1 a 4).

Ainda que varie de disciplina para disciplina, a maioria dos alunos do 1º ano dirige-se primariamente ao seu assistente ou ao regente da UC para colocar reclamações quanto à qualidade da sua formação. No 2º ano o paradigma altera-se substancialmente. Em todas as UC, o principal receptor de reclamações é a Comissão de Curso. Um apontamento importante: o departamento de Educação Médica da AEFCML, representante permanente dos alunos no Conselho Pedagógico, recebeu 0 respostas nesta questão.

A abertura do Conselho Pedagógico às intervenções dos alunos é classificada com 3 (numa escala crescente de 1 a 4) pelos alunos do 1º ano, com uma variabilidade de respostas baixa (ainda que 30% não tenha respondido à questão). Estes resultados contrastam com os do 2º ano. Mais uma vez AP recebe a nota mais negativa: moda 1 (“não dá qualquer resposta satisfatória”) e média de 1,71. Farmacologia, FAT I e II e IAC recebem nota 2; FN e Introdução à Clínica recebem as únicas notas positivas, 3.

Métodos de Avaliação

stats2

Quanto à concordância dos discentes no que toca ao método de avaliação, todas as UC do 1º ano recebem nota positiva, 3 ou 4. No 2º ano todas as UC recebem nota 3, com uma excepção: 71% dos inquiridos rejeita o método de avaliação de AP e a moda de respostas é, de facto, 1, “discordo” (média 1,88).

Em média, quase 80% dos alunos do 1º ano declaram que sim, a sua avaliação nas várias UC recaiu sobre os objetivos de aprendizagem declarados. No 2º ano este valor diminui um pouco, para aproximadamente 70% – isto se retirarmos novamente o pior classificado da equação. A avaliação de AP recebe o aval de apenas 20% dos inquiridos e 69% rejeitam-na.

Da parte dos alunos, analisando a sua participação na avaliação eletrónica das UC, apenas 31% (no 1º ano) e 48% (no 2º ano) dos inquiridos efectuaram a avaliação online.

Avaliação Global

Destacando os principais resultados em termos de avaliação global: no 1º ano 56% dos alunos dão nota 3 e 20% nota 2 ao seu plano curricular e a nota média é de 2,82; no 2º ano 41% dão nota 2 e 39% nota 3, e a nota média é de 2,45. Resumidamente: “nim”.

Nas questões de resposta curta – “qual o aspecto mais positivo/negativo do programa curricular” – verificamos que, na opinião dos alunos, existem pontos onde o plano curricular carece francamente de melhorias. Estas respostas repetem-se exaustivamente ao percorrer as centenas de inquéritos, e são elas as três “faltas”: falta de tempo para as UC, falta de organização e falta de conteúdos prévios. O principal ponto positivo que os alunos destacam, por outro lado, é a presença da prática clínica já a partir dos primeiros anos de ensino na FCM-NOVA.

[hr]

Agradecemos a disponibilidade e compreensão dos vários intervenientes neste projeto, nomeadamente: aos docentes das várias aulas práticas a que recorremos para chegar a todas as turmas do 2º ano; aos docentes da UC de Nutrição e Metabolismo, através dos quais chegámos ao máximo de alunos do 1º ano possível; à Prof. Doutora Maria Emília Monteiro, ao Prof. Doutor Miguel Xavier e ao Prof. Doutor Pedro Costa, pelo insight prestado e pela disponibilidade em analisar os resultados deste inquérito. Esperamos que, através do nosso trabalho, seja fortificada a qualidade do ensino na nossa faculdade. Que as contribuições de todas as partes com este fim – sejam de alunos, de docentes, de dirigentes – possam ser apreciadas com moderação e espírito crítico e aceites na plenitude do uso da razão.

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Ex-aluno da Faculdade de Ciências Médicas, atualmente Interno do Ano Comum, André Ferreira participou na vida académica da sua faculdade tendo sido membro da Direção da AEFCML no mandato 2012/2013, onde foi responsável pelo departamento de Imagem e Comunicação. Participou nas Comissões Organizadoras do iMed Conference 4.0 e 5.0. Foi Diretor da Revista FRONTAL durante o mandato 2012/2013 e responsável por várias áreas de imagem no mandato seguinte.

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