Se vos perguntassem qual é a linguagem universal, iriam, com certeza, considerar uma questão “ridiculamente” óbvia e responderiam, quase instantaneamente com bastante convicção, que é o Inglês. Contudo, se expandirmos os nossos horizontes, o pensamento seria outro, pois sendo algo que vagueia diariamente na nossa atmosfera por vezes esquecemo-nos dela – a música.
Segundo o Dr. Oliver Sacks, professor de Neurologia e autor do famoso livro “O Homem que Confundiu a Mulher com um Chapéu”, a música não apresenta nem conceitos nem preposições, falta-lhe as imagens, os símbolos – todas as características de uma linguagem – e no entanto é uma interligação universal.
A música existe desde sempre, e, além de ser a chave para a criatividade e imaginação, sabe-se que esta possui uma grande influência sobre o cérebro humano, o nosso centro de direção cujas incógnitas vão sendo reveladas. De acordo com Dr. Oliver Sacks (no comentário “The Power of Brain” no Brain of Oxford Journals) a música, além de ter o poder de despertar fortes emoções em doentes com autismo e síndromes do lobo frontal, também pode aproximar da realidade os doentes com Alzheimer avançado ou com outras demências, nem que seja por alguns segundos.
[pullquote]A música tem o poder de despertar fortes emoções em doentes com autismo e síndromes do lobo frontal[/pullquote]Outra questão fundamental inspirada no Society of Neuroscience é a dose de música para o alívio da dor (www.brainfacts.org). Para compreender melhor esta natureza, os cientistas exploraram a forma como o cérebro processa a música durante a dor. A neuroimagiologia revela que ouvir música agradável aumenta a atividade do centro da recompensa. De facto, segundo Dr. Robert Zatorre (Universidade McGill) que estuda as emoções e a música: “A música agradável promove a libertação de dopamina, esta alteração está fortemente associada a outros estímulos que induzem a motivação e a recompensa como é o caso da alimentação, sexo e certos fármacos que provocam dependência”.
Outros estudos apresentaram como hipótese a intervenção da música nos sinais de dor a nível da medula espinhal através das alterações dos reflexos de fuga, em função dos tipos de música. Mathieu Roy (psicólogo da Universidade de Colorado) concluiu que ouvir música desagradável desencadeia reflexos mais fortes assim como maiores queixas de dor.
Se frequentaram aulas de um instrumento musical em idade pré-escolar agradeçam aos vossos pais e professores pois estas contribuíram para o desenvolvimento dos vossos cérebros. Um estudo publicado no Journal of Neuroscience, coordenado pela Dra. Virginia Penhune (professora de psicologia da Universidade de Concordia) em colaboração com Dr. Robert J. Zatorre (investigador na Universidade de McGill), fornece fortes evidências que a idade compreendida entre os seis e oito anos é um “período sensível”, no qual o treino musical interage com o desenvolvimento cerebral normal, de forma a criar alterações duradouras, tanto na estrutura cerebral como nas habilidades motoras.
A experiência baseou-se em testar 36 músicos adultos em tarefas de movimento e analisar os cérebros através de uma técnica de ressonância magnética (Diffusion Tensor Imaging – DTI). Enquanto metade do grupo começou os treinos antes dos sete anos, a outra metade foi numa idade mais avançada; os dois grupos tiveram o mesmo período de treino musical e de experiência. Por fim, estes dois grupos foram comparados com indivíduos que tiveram pouco ou nenhum treino musical. [pullquote align=”right”]Começar cedo [a aprender a tocar um instrumento] pode ajudar-nos a expressar a nossa genialidade; no entanto, não nos vai tornar um génio[/pullquote]Neste seguimento, conclui-se que: os músicos cujo começo de treino musical se sucedeu mais cedo apresentaram um aumento da substância branca a nível do corpo caloso e do lobo temporal, verificando-se uma maior interação inter-hemisférica e integração sensorimotora. Por outro lado, as imagens DTI do cérebro não apresentaram nenhuma diferença entre os não-músicos e os que começaram numa idade mais avançada, indicando que há um “período sensível” para o desenvolvimento cerebral. Por último, uma vez que os músicos também foram testados numa tarefa motora não-musical, descobriu-se que as vantagens de um treino musical antecipado, estendem-se além da habilidade de tocar um instrumento. Apesar de tudo, segundo Dra. Virginia Penhune: “É importante relembrar as habilidades específicas que os músicos ganham com um treino precoce. Contudo estas alterações não os tornam necessariamente melhores músicos. O desempenho musical é sobre aptidões, mas também é sobre comunicação, entusiasmo, estilo e muitas outras características que são imensuráveis. Por isso, começar cedo pode ajudar-nos a expressar a nossa genialidade; no entanto, não nos vai tornar um génio”.
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Para os iniciados neste tema e para os que ficaram interessados com este artigo, convido-vos a comparecer ao simpósio internacional “MUSIC, POETRY AND THE BRAIN: Celebrating Wagner’s Bicentennial”, coordenado pelo Professor Dr. Armando Sena (docente na FCM-NOVA), na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa no dia 25 de maio. É um evento de renome que conta com a presença dos célebres investigadores, entre os quais António Damásio, Robert Zatorre, Virginia Penhune. Para mais informações consultem o site musicpoetrybrain.com.