Ao contrário do que se tem dito, o HeartMate 3™ não se trata de um coração artificial.
Na realidade, a primeira cirurgia de implantação de um coração artificial total num ser humano foi efetuada em 1969 pelo Dr. Cooley (Texas Heart Institute), num doente que aguardava transplante após a rotura de um aneurisma ventricular esquerdo. O coração artificial esteve implantado no toráx do doente e a funcionar corretamente durante 3 dias, tempo necessário para encontrar um dador para transplante. Infelizmente, o doente faleceu após o transplante devido a uma pneumonia a Pseudomonas spp.
O primeiro coração artificial a ser aprovado pela FDA foi o atual SynCardia temporary Total Artificial Heart (inicialmente denominado CardioWest THA). Este dispositivo é colocado ortotopicamente e é composto por duas câmaras de poliuretano que substituem os ventrículos e por válvulas mecânicas que mantêm o fluxo unidirecional. Este sistema foi aprovado pela FDA para ser utilizado como uma ponte para o transplante.
Um coração artificial envolve a remoção do coração, ao passo que um dispositivo de assistência ventricular é implantado no coração do doente. Os sistemas de assistência ventricular foram desenvolvidos para ajudarem à função do ventrículo esquerdo, direito ou ambos. Isto quer dizer que auxiliam o ventrículo com lesão a bombear o sangue, mas não substituem o coração.
Uma das vantagens dos dispositivos de assistência ventricular relativamente ao coração artificial é a de os ventrículos preservados permitirem uma eventual recuperação da capacidade de tolerar exercício físico, uma vez que deixam de estar consecutivamente em sobrecarga.
O HeartMate 3™ (Thoratec®) é um dos sistemas disponíveis no mercado para suporte circulatório mecânico prolongado e foi o escolhido para a primeira cirurgia de implantação em Portugal.
Estes dispositivos encontram-se já na sua 3ª geração. Os dispositivos de 1ª geração operavam através de propulsão pneumática e habitualmente eram colocados em posição infra-diafragmática. Devido à elevada taxa de falência do aparelho, foram desenvolvidos os dispositivos de 2ª geração. Estes eram sistemas axiais de fluxo contínuo que apresentavam grandes vantagens relativamente ao sistema anterior.
Os dispositivos de assistência ventricular esquerda (os mais comuns) podem ser usados para suporte circulatório a curto-prazo, como ponte para o transplante ou como terapia de destino para doentes sem indicação para transplante cardíaco. Em alguns casos, estes dispositivos podem ser usados para permitir a recuperação da função do coração (ao fim de algum tempo o dispositivo é explantado).
Este dispositivo foi desenhado para ser colocado no interior do pericárdio. Possui dois tubos: um tubo de entrada de sangue que é colocado no ventrículo esquerdo e um tubo de saída de sangue, inserido na artéria aorta, na sua porção ascendente. O rotor presente dentro do dispositivo funciona segundo a tecnologia MagLev™, isto é, levitação magnética. Esta levitação magnética diminui as forças de cisalhamento a que o sangue está sujeito durante a passagem pelo interior do dispositivo e, consequentemente, diminui os efeitos deletérios sobre a integridade das hemácias. Para além disso, o revestimento interno do dispositivo é efetuado com micropartículas de titânio, o que diminui a trombogenicidade do mesmo.
Tal como o fluxo normal do sangue, o dispositivo permite criar um fluxo pulsátil à custa de mudanças de velocidade do rotor a cada 2 segundos: trata-se de uma característica importante porque permite que a válvula aórtica mantenha o seu funcionamento ao mesmo tempo que diminui a estase ventricular. O rotor opera a velocidades de 3000 a 9000 rpm, com um caudal máximo de 10 L/min.
A alimentação do motor da bomba é feita com duas baterias externas de iões de lítio que estão ligadas através de um cabo percutâneo inserido durante a cirurgia.
De acordo com os dados fornecidos pela Thoratec®, o HeartMate 3™ permite aos doentes melhorar a sua qualidade de vida, quer em termos de classe NYHA (que classifica a limitação das atividades físicas devidas à insuficiência cardíaca) quer em termos do aumento da distância percorrida em 6 min, que duplica após a cirurgia.
A introdução desta tecnologia em Portugal vai assim permitir a doentes com insuficiência cardíaca terminal (que não têm indicação para transplante) melhoria significativa da sua qualidade de vida.