Medicina Desportiva: especial(idade) como as outras ?

Até há pouco tempo, os pré-graduados em Medicina teriam decerto dúvidas sobre a Medicina Desportiva ser ou não uma especialidade médica. Na verdade, e a menos que estes  futuros médicos sejam também atletas de alta competição ou tenham de algum modo uma relação próxima com o desporto, é pouco provável que considerem este percurso formativo – não tanto por real desinteresse, acreditamos, como por falta de esclarecimento. A justificação para o fenómeno é rapidamente apontada, por qualquer formando em Medicina: o plano de estudos não contempla (ou não aprofunda) esta vertente, e a típica e errada ideia de que tal área é para aqueles que querem ser o  «médico da seleção» ou o «médico do Benfica».

              100525futebol_f_012Nas III Jornadas Médico Activo Paciente Activo, organizadas pelo Club Clínica das Conchas no passado dia 16 de Novembro em Lisboa, cuja plateia era constituída maioritariamente por estudantes de Medicina, um dos momentos mais aguardados do dia foi a intervenção do Dr. Paulo Beckert, especialista em Medicina Desportiva e em Medicina Física e da Reabilitação, que se prontificou a clarificar: “trata-se de uma especialidade médica, reconhecida pela Ordem dos Médicos desde 2009; não de uma mera área do conhecimento ligada ao desporto”. No entanto, é Doctor examining a sports injuryimportante revelar que não era uma especialidade acessível a um estudante que terminasse o curso e realizasse a PNS (prova nacional de seriação) até há dois anos, sendo que o 1º interno a fazê-lo iniciou a sua formação em 2013, e é portanto a «cobaia» do plano de estudos, já há muito tempo criado, mas que só agora entrou em vigor. Antes disto esta área funcionava mais como uma «subespecialidade», que teria de ser aprovada pela sociedade reguladora da mesma. Será, portanto, idêntico a dizer que se é médico cardiologista ou gastrenterologista.  A designação, herdada do inglês “Sports Medicine”, não é talvez a mais feliz em Portugal, pois sugere uma ligação exclusiva a modalidades[pullquote align=”right”]«trata-se de uma especialidade médica (…) não de uma mera área do conhecimento ligada ao desporto»[/pullquote] desportivas que não é a essência em que assenta esta especialidade. Mais adequado seria, portanto, uma “Medicina do Exercício”, pois traduziria melhor uma prática que acompanha não só as elites desportivas, como a população em geral – a actividade física pode ser praticada de forma indiferenciada, e na realidade os problemas de saúde que coloca um entusiasta da corrida antes de uma maratona, são tão ou mais complexos que os de um atleta olímpico em véspera de competição.

PLANO DE ESTUDOS

A formação específica em medicina desportiva tem a duração de 48 meses (4 anos), sendo antecedida de uma  formação genérica partilhada por todas as especialidades  e designada por ano comum (12 meses).

Os âmbitos e finalidades da formação específica assentam nos seguintos pontos:

  • A medicina desportiva é uma especialidade médica que se ocupa da prevenção, profilaxia, diagnóstico e tratamento das diversas patologias relacionadas com o exercício físico e a prática desportiva em todos os grupos etários;
  • A medicina desportiva, pelas suas características específicas, apresenta uma estreita ligação com várias especialidade médicas e tem um papel fundamental no desenvolvimento dos programas de exercício e desportivos da população;
  • A medicina desportiva vem assumindo um papel primordial na prevenção de doenças cardiovasculares, metabólicas, neoplásicas, psiquiátricas e outras, através da prescrição da prática do exercício físico regular;
  • A medicina desportiva tem um carácter multidisciplinar, abrangendo todos os grupos etários  e todos os níveis de prática de exercício e desportivo, recorrendo a várias técnicas de diagnóstico, terapêutica e de investigação que requerem aprendizagem profunda;
  • A medicina desportiva é uma área que tem que ser impulsionada em termos quantitativos e qualitativos, exigindo-se ao médico interno uma sólida aprendizagem nas várias áreas do conhecimento médico relacionado com o exercício físico, para permitir uma boa prática da medicina.

A sequência da formação é a seguinte: 12 meses de estágio em medicina desportiva geral, 9 meses de estágio em cardiologia, 3 meses em pneumologia, 3 meses em fisiologia do exercício, 6 meses em ortopedia e traumatologia,  3 meses em fisiatria, 3 meses em patologia clínica e toxicologia, 3 meses em estágio opcional (psicologia desportiva ou dietética e nutrição) e 6 meses de estágio prático em departamento médico de uma instituição desportiva.

[alert type=”info”]http://dre.pt/pdf1s/2009/03/05800/0186001863.pdf[/alert]

Como os primeiros médicos a seguirem esta sequência de formação específica ainda estão a meio percurso é díficil definir e caracterizar a estrutura da mesma, sendo portanto um caminho (ainda) nebuloso, sendo necessários alguns anos para apurar a qualidade dos formandos e da especialidade em si no nosso país. No entanto, tudo indica ter um futuro promissor.

EXAME MÉDICO-DESPORTIVO

Nas mesmas jornadas houve também uma sessão dedicada ao exame médico-desportivo onde muitos pontos foram clarificados, o tópico que merece realce é o facto de que, hoje em dia, qualquer médico realiza exames deste tipo, o que na perspectiva dos médicos especialistas em medicina desportiva está errado, defendem que somente estes especialistas deveriam fazê-lo uma vez que são os mais aptos para tal. Este é um aspecto muito debatido e que levanta muitas questões tais como: a permissão ou não da subida de uma atleta em dois ou mais escalões; a permissão para fazer competição perante situações de saúde questionáveis, entre outras.

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Exame médico-desportivo

É de extrema importância referir que esta especialidade, tal como é óbvio, se encontra em constante comunicação e contacto com outros profissionais do desporto (fisioterapeutas, treinadores pessoais, treinadores de equipas, nutricionistas, etc) e que sem este contacto intímo os objetivos da mesma ficam comprometidos, uma vez que a terapêutica prática a ela inerente necessita do apoio e da reunião de esforços por parte quer do médico, quer do doente, quer do pelotão profissional acompanhante.

Cabe então, ao médico especialista em medicina desportiva uma correcta prescrição de exercício, de preferência inócuo, e caso hajam lesões a ele associado a detecção e o tratamento mais adequado.

SOCIEDADE PORTUGUESA DE MEDICINA DESPORTIVA

Fundada em 1994 por 17 médicos, sendo actual membro da FIMS (federação internacional da medicina desportiva) e da EFSMA (Federação Europeia de Associações de Medicina Desportiva). Desenvolvem pós-graduações e workshops frequentemente (para mais informações visitar o site).

[alert type=”info”]http://www.spmd.pt/a-spmd/sociedade[/alert]

justin_mujica

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Aluna do 6º ano do MIM na FCM-UNL, oriunda de Loulé, apaixonada pela praia, pelo sol e pelo campo, ingressa na FCM em 2010 e desde 2012 que colabora com a secção de Saúde e Bem-Estar da FRONTAL. Como amante de desporto e praticante de atletismo, veste as cores da universidade NOVA e leva o nome desta mui nobre faculdade aos campeonatos universitários. Ao desporto alia o seu clarinete que toca desde os 8 anos e um gosto amador pela pintura, o que não pode acontecer é ter tempo livre. Tem especial curiosidade e apetência pelo estudo e compreensão do mundo que a rodeia, o que a leva a questionar e a querer descobrir as razões e as soluções para os problemas que surgem no seu caminho.

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