Estoril Conferences 2023 (Dia 2)

Novamente moderado pela sempre competente Anelise Borges, repórter da Euronews, o 2º dia das Estoril Conferences voltou a encher o átrio da Nova SBE de, perdoem o pleonasmo, expectantes espetadores para mais um dia repleto de ilustres convidados de variadas áreas. 

Desta feita, o dia começou com alguns comentários iniciais, perfumados pelo cheiro a café matinal que se sentia no recinto, da parte dos diretores da Nova SBE e NMS (Pedro Oliveira e Helena Canhão, respectivamente), bem como de João Costa, ministro da educação e ainda Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

Após esta introdução, o ciclo de conferências recomeçou efetivamente com um convidado de peso: Aaron Chiechanover, cientista laureado pelo Nobel da Química. Na sua breve apresentação, discorreu acerca das grandes possibilidades e perigos que a sequenciação do genoma humano – a seu ver, a maior inovação científica do nosso tempo – pode trazer. Se, por um lado, poderá trazer uma medicina muito mais individualizada e custom-made, as questões sobre a privacidade do genoma mantêm-se no ar. Quem terá acesso ao nosso genoma? Podemos confiar em grandes grupos de saúde? 

Tal como no dia anterior, também neste se falou (e muito) do tema na ordem do dia: inteligência artificial, vulgo AI. Depois de no dia anterior termos ouvido um professor de Harvard, desta vez ouviu-se o professor da NYU Stern Anindya Ghose. Um auto-proclamado “optimista” da AI, defendeu a importância do papel humano no discernimento, em contraste com o forte da AI: a previsão de diferentes cenários. 

Em jeito de conclusão do tema, os dois oradores acima mencionados integraram de seguida um painel composto ainda por Chen Zhiyu (CEO da Dmall) e Ricardo Gil da Costa, fundador e CEO da Neuroverse, projeto inovador que a FRONTAL teve a oportunidade de poder testar. Numa mesa redonda relativamente desinspirada, discutiu-se sobretudo a importância de manter um apertado escrutínio sobre a AI e sobre as empresas que criam estas novas ferramentas que vão surgindo.

O resto da manhã foi ainda presenteado por uma boa variedade de intervenientes, contando inclusive com dois moderadores formados pela NMS. Por um lado, Inês Vivas, médica formada na NMS, atualmente a trabalhar junto da OCDE, moderou uma conversa que contou com o médico/artista visual Fola David. Também na moderação esteve Nuno Palma dos Reis, aluno de 6º ano de Medicina na NMS e fundador do projeto NOWACE, com uma conversa acerca da re-humanização das próximas gerações, com o grande ímpeto de se potenciar uma constante aprendizagem e comunicação em sociedade. 

Em antecipação para a pausa de almoço que dita a meia reta deste dia, houve ainda tempo para uma curta performance musical, com um trio composto por dois médicos (José Themudo Barata e Fernando Heleno) e o músico Paulo Rosado.

Enquanto que a manhã se pautou por alguns momentos menos concisos, a última tarde do evento teve um claro ritmo, em jeito de conclusão. Começando com um dos nomes mais sonantes do mundo da saúde, Robert Langer. Se a simples menção deste nome ainda não vos fez deixar cair o queixo é porque, tal como o vosso humilde correspondente, são uns meros leigos nestes assuntos. Detentor de cerca de 1400 patentes, Robert Langer é atualmente o 2º indivíduo mais citado em publicações científicas, coordenador do maior laboratório de engenharia biomédica do mundo (do MIT) e fundador da Moderna. Entre muitas(!) outras coisas. É, sem sombra de dúvida, detentor do mais vasto currículo dos oradores que por estas conferências passaram. Na sua intervenção realizada via videochamada, realçou sobretudo alguns dos maiores feitos da sua carreira, nomeadamente a criação dos primeiros agentes inibidores da angiogénese, terapêutica que é atualmente amplamente utilizada em doentes com cancro; e ainda sobre o desenvolvimento, com a Moderna, das vacinas de mRNA no combate à pandemia de Covid-19. Com efeito, salientou a incrível rapidez com que as vacinas puderam ser criadas graças a esta tecnologia, tendo sido criadas efetivamente apenas 2 dias após a sequenciação genética do vírus. Uma tremenda evolução. Concluiu não com os olhos postos em feitos passados, mas nas possibilidades do futuro, apontando o dedo para vacinas personalizadas para o combate ao cancro. Uma apresentação interessantíssima.

De seguida, o tema foi bruscamente mudado para algo totalmente diferente, desta vez com a portuguesa Ana Carolina Sena, manager de parcerias na plataforma de live-streaming Twitch. Numa palestra interessante, realçou sobretudo as atuais tendências do mercado, mostrando a mudança do paradigma vigente: os consumidores já não querem apenas os conteúdos curados pelos grandes estúdios, querem algo mais próximo, mais relatable, sobretudo mais personalizado. Querem, no fundo, sentir-se representados em alguma forma de media, e estas plataformas acabam por dar e democratizar esse palco, dantes apenas ocupado pelas maiores caras. 

Com a aproximação do fim do evento, chegou-se a um dos momentos mais interessantes destes dois dias,  com a apresentação dos projetos premiados da plataforma Patient Innovation. Fundada em 2014, esta plataforma parte da premissa de que os doentes e outras pessoas que contactem com problemas de saúde podem ter um papel ativo na apresentação de soluções criativas e disruptivas, apresentando projetos que tenham desenvolvido. Por sua vez, a Patient Innovation encarrega-se de promover os projetos com maior potencial, procurando investimento. Como parte dos fundadores da plataforma, os diretores Helena Canhão e Pedro Oliveira subiram uma vez mais ao palco para introduzir os projetos premiados. 

Foram apresentados vários projetos, desde luvas para melhor deteção do cancro da mama até óculos que permitem auxiliar pessoas com grande diminuição de visão a evitar obstáculos. Os vários projetos apresentados pautaram-se pela sua variedade e engenhosidade. 

(todos os projetos estão descritos em maior detalhe no fim do artigo)

Finalmente, ainda houve tempo para uma despedida musical a cargo do amplamente conhecido Salvador Sobral. Numa curta atuação, pautada por pequenos comentários com o público, falou sobre o transplante cardíaco a que foi submetido, enquadrando esta intervenção com as inovações que se têm dado na área da saúde. Como não podia deixar de ser, passou obrigatoriamente pelo seu maior hit, Amar pelos Dois, mas ainda houve tempo para uma canção extra, a pedido do público. Tendo em conta o projeto apresentado anteriormente, para pessoas com dificuldade de visão, pareceu adequado ter escolhido um tema de Ray Charles (ele próprio cego), What Would I do Without You, para fechar este evento.

Tendo chegado ao fim, é de louvar a exemplar organização do evento e a sua elevada diversidade de oradores e temas discutidos. Com efeito, foram várias as palestras que durante a globalidade do evento não só cativaram, mas também suscitaram novas questões acerca de inovações em saúde, inovações no domínio da AI, novas tendências de mercado, etc. É de salientar ainda a mais valia que aparenta ser a associação da Nova Medical School a este evento, ficando as expetativas de que esta se mantenha nos próximos anos e de que se continue a associar a outros eventos de semelhante dimensão. 

 

Alguns dos projetos mais interessantes encontrados nas Estoril Conferences:

Neuroverse: A Neuroverse é uma empresa que desenvolve produtos relacionados com a neurotecnologia, focada em soluções para melhorar a saúde mental e o bem-estar. O seu produto principal é um dispositivo wearable avançado que combina tecnologia de monitorização cerebral com inteligência artificial para ajudar os utilizadores a compreender e melhorar a sua saúde mental, oferecendo insights e recomendações personalizadas com base nas atividades cerebrais. Auxilia ainda no controlo e análise do sono, bem como na gestão de doenças mentais. 

https://www.neuroverseinc.com/

 

Uhura bionics: Um dispositivo que funciona como uma eletro-laringe, permitindo dar voz (literalmente) a quem a perdeu. Com um dispositivo que se pauta pela sua forma francamente discreta, amplifica a voz e permite dar timbres diferentes ao indivíduo. A sua apresentação foi muito surpreendente, apesar de mostrar ainda a necessidade de alguns afinamentos tecnológicos, sobretudo no timbre altamente robótico da voz. 

https://www.uhura.pl/

 

BIEL GLASSES: Com o grande objetivo de devolver alguma independência a pessoas com graves défices visuais, os Biel Glasses surgem como um guia visual. Essencialmente, estes óculos reconhecem e sinalizam obstáculos, alterações de pavimento ou luzes de semáforo (entre outros) para auxiliar estas pessoas a andar na rua com maior segurança. De realçar da apresentação, foi o seu preço competitivo e a necessidade de apoios estatais para tornar esta e outras inovações acessíveis para as pessoas com défices visuais. 

https://bielglasses.com/

 

Glooma: Empresa portuguesa (única aqui representada) muito promissora, oferecendo um novo dispositivo no auxílio à deteção do cancro da mama. A SenseGlove é uma luva que permite à própria mulher analisar o seu tecido mamário com maior precisão. A luva, ao sentir alguma alteração no normal tecido, mostrará um aviso indicando que deverá ser vista por um médico, procurando assim levar a diagnósticos mais precoces do cancro da mama. Este produto encontra-se já em fase de teste piloto em diversas instituições de saúde, tais como a Cuf Descobertas ou o Hospital Fernando da Fonseca, tendo reportado resultados muito satisfatórios. 

https://glooma.pt/



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