Dia 3 do iMed 6.0. Mais um dia, o último dia. O programa manteve-se interessante e diverso, com uma manhã inicialmente mais dedicada à Física, com uma palestra sobre Medicina Personalizada no tratamento do cancro pancreático e mais um evento competitivo, desta vez dedicado à investigação científica. À tarde, pudemos contar com as sonhadas iMed Sessions, com a beleza do espaço e da música. A despedida fez-se com um sentimento de missão cumprida e notou-se, como seria de esperar, uma certa comoção no seio da comissão organizadora.
i(ntelligent)Speeches: a Máquina ao serviço do Homem
Embora já tenhamos evoluído da antissepsia de Semmelweis para a assepsia, os procedimentos cirúrgicos continuam a ser associados, pelo seu carácter classicamente invasivo, a complicações várias e infecciosas. Chega. Muitos dos fármacos de efeito sistémico afectam tecidos de forma difusa e provocam por isso efeitos adversos. Basta. A manhã deste último dia do iMed 6.0 começou então com a palestra do ambicioso Dr. James Choi, que, com a sua receita de ultrassons e microbolhas, pretende direccionar fármacos contra tipos de células precisos, tais como os neurónios do hipocampo ou as células endoteliais vítimas da agressão aterosclerótica.
O segundo orador da sessão “Man & Machine”, o muito sério Dr. Zoltán Takáts, focou-se mais no problema temporal da cirurgia oncológica, no tempo que decorre entre a recolha intra-operatória de tecido para estudo histopatológico e a chegada do veredicto do patologista. Apresentou o público à sua iKnife, um instrumento cirúrgico que corta tecidos e lhes aspira uma pequena amostra, dissociando-a em partículas que são imediatamente analisadas recorrendo à espectrofotometria. 0,7 a 2,5 segundos depois, ficamos a saber se estamos a fazer incisões em tecido normal ou neoplásico! Talk about real-time diagnosis…
Acabou a sessão falando do iEndoscope, que fará também, espera-se, o diagnóstico de uma neoplasia Do tubo gastro-intestinal em poucos segundos
“An ounce of prevention is worth a pound of cure”
Bem-vindo de novo, Professor Brunicardi! Pela segunda vez neste congresso, o nosso estimado e carismático cirurgião também artista subiu ao palco para falar, mas desta vez sobre Medicina Personalizada.
De novo contou a história, tal como fez no ano anterior, de Mendel e das suas ervilhas, da descoberta do ADN (explicando sempre por que razão Rosalind Franklin não recebeu o prémio Nobel), da sequenciação do genoma humano e da Medicina Personalizada. Claro que o caso da nova Dama Jolie veio mais uma vez à superfície, mas não foi o único. Voltou-se a falar do PDX-1 e de como poderá, num futuro mais ou menos próximo, actuar na prevenção das neoplasias do pâncreas.
Os conselhos de Stella Hurtley
Só 5% dos manucritos submetidos à revista Science são aceites, mas note-se (como ela realçou) que “os artigos são revistos por pessoas reais”, e não por seres insensíveis, portanto. Muitas são as razões que levam à rejeição de artigos e alguns são os truques que se pode usar para combater esta estatística desanimadora. Primeiro, treinar: treinar, treinar, treinar. Aprender a escrever bem e de forma inteligível para todos (especialistas da área, outros cientistas, media…). Foi uma apresentação sem dúvida extremamente útil e interessante para muitos, em particular para os investigadores que participaram na Fundação Astrazeneca – Innovate Competition, que contou com apresentações tão variadas quanto era possível, nos domínios da investigação básica e translacional. Falou-se de β-talassémia, de DPOC, de dengue, de síndrome metabólica… entre outros temas.
“Choose a job you love and you won’t have to work a day in your life.”
Há que deixar escritas umas palavras quanto ao sucesso das inspiradoras iMed Sessions. Começou-se com uma viagem ao espaço. “Queridos estudantes!”, talvez um dia possamos sentir na pele o que é a falta de pressão hidrostática e a incapacidade de realizar movimentos parabólicos. Francesco Torchia trouxe imagens raras de paisagens espaciais e de momentos na vida quotidiana de um astronauta em missão. Imagens tão originais, diferentes e estranhas para os comuns seres terrestres que quase nos surpreendeu ao falar em monotonia física e social. Mesmo perante todos os riscos psicológicos e físicos (sobretudo para os sistemas cardiovascular e músculo-esquelético), terá muito provavelmente ficado no público uma vontade de viajar para o espaço. Para quando, os voos comerciais para todos?
Obrigada, Jessica Grahn. Não é todos os dias que se ouve uma oradora completa: energética, carismática, simpática, interessante e apaixonada pelo que faz. Foi difícil conter o riso indiscreto face às patadas rítmicas de Snowball ao som de Backstreet Boys. Também não é todos os dias que se ouve a palavra groove aplicada num projecto de investigação científica. Falou-se de música, de ritmo, e de como estes dois afectam o nosso sistema nervoso central e estimulam as nossas áreas motoras. Teremos aqui uma terapêutica adjuvante para doenças cerebrovasculares e neurodegenerativas? Veremos. O que se sabe é que o público entrou em êxtase perante a perspectiva e ficou entusiasmado com este final de congresso.
Cerimónia de encerramento?
Mas, antes da entrega dos prémios e dos discursos finais por vezes pontuados pelo tremelicar do nervosismo, reservaram-nos uma última, densa e pesada sessão sobre oncologia pediátrica, que foi uma surpresa para quem esperava uma cerimónia de encerramento ligeira. Leucemia linfoblástica aguda (LLA) foi o tema explorado pela Dra. Shannon Maude e muitos foram os alunos que não seguiram o fio condutor da apresentação. Considerando que as células neoplásicas são células que de algum modo escaparam ao reconhecimento pelo sistema imunitário, a Dra. Maude centra esforços na busca de um fármaco que, além de ter grande especificidade para a população pediátrica, tenha grande especificidade para linfócitos. O que propõe é uma forma de levar linfócitos T citotóxicos a expressar à superfície um receptor que não existe na natureza, o Chimeric Antigen Receptor, que reconhece exclusivamente o antigénio CD19 presente nas células deste tipo de tumor hematopoiético. Espera, assim, conseguir desenvolver uma imunoterapia eficaz e capaz de fazer sorrir as crianças (e as famílias) vítimas da LLA.
A cerimónia de encerramento propriamente dita que se seguiu a esta última palestra foi marcada pelo anúncio dos vencedores da Innovate Competition e pelos discursos da Presidente da AEFCML Teresa Nóbrega e da Presidente do Congresso iMed 6.0 Catarina Palma dos Reis, que discursou com uma calma e uma serenidade que nunca deixariam antever a fonte de preocupação e de stress que é organizar um evento desta dimensão.
E no fim dos três dias, o que ficou?
Ao longo destas seis edições, o iMed foi marcando, a passos largos, o seu lugar no mundo das conferências. Perdeu o seu estatuto de conferência “de faculdade”, familiar e acolhedora, para invadir o território nacional e internacional. Cresceu, revolucionou-se e apresentou-se agora, seis anos volvidos, orgulhosa e triunfante perante a comunidade científica.
Usando a velha máxima, a iMed Conference foi fruto de sangue, suor e lágrimas. Este esforço culminou num desfile de mentes brilhantes, que decidiram dar o seu contributo para um crescimento intelectual colectivo através de palestras interactivas e, sobretudo, humanas.
E, respondendo à questão inicialmente colocada no website do iMed – “What is Science?”, a ciência é isto.