Porquê falar de alimentação? Porque, naturalmente, trata-se do alicerce major da nossa sobrevivência. Seja ela saudável, ou não, ninguém nega que a alimentação é essencial para que tenhamos energia para todas as funções vitais que o Homem desempenha, desde respirar até atividades banais como a fala e o exercício físico.
A comida dita saudável (“Healthy” ou “Clean”) tem sido uma preocupação cada vez mais evidente, quer em Portugal, quer nos restantes países ocidentais. O motivo dessa mudança de paradigma prende-se com o bombardeamento constante de informações e notícias (fidedignas, ou não) acerca dos efeitos nefastos de certos alimentos para a nossa saúde. No entanto, algumas das polémicas mais recentes que dão origem a grandes machetes como “a carne vermelha pode ser cancerígena” ou “substâncias presentes no peixe podem aumentar o cancro de mama e a ocorrência de metástases” podem ser desmistificadas e clarificadas se recorrermos a fontes seguras como artigos científicos e revistas da área da nutrição.
Ao longo das próximas semanas a FRONTAL pretende dar-te um novo olhar sobre alguns dos assuntos mais em voga no campo da alimentação. Mas, afinal, o que andamos a comer?
Comecemos com um dos mitos clássicos:
Comer Hidratos de Carbono, sim ou não?
Os hidratos de carbono contribuem com a energia necessária para as funções vitais do organismo, sendo que apenas o cérebro consome cerca de 120 gramas diárias (o que corresponde a 5 colheres de sopa de arroz ou massa cozida). Portanto, uma ingestão inferior a esta quantidade pode acometer as funções cerebrais e implicar a mobilização da proteína muscular para formar glicose (através da neoglicogénese), visto que não nos é conseguido fazer isso através dos ácidos gordos da dieta, em primeira instância, ou recorrendo às reservas de gordura.
A resposta do nosso organismo a um período de privação energética será no sentido de diminuir o seu gasto, focando-se no desempenho das funções essenciais. Isto deve-se em parte à redução da síntese e atividade das hormonais tiroideias. Além disso, é observada uma diminuição da leptina e um aumento da grelina, com consequente aumento do apetite e diminuição do gasto energético, além de uma diminuição dos níveis de insulina (hormona anabólica) e aumento do cortisol, que em níveis elevados durante um longo período, incita uma perda de massa muscular, retenção de líquidos e acumulação de gordura de localização visceral, interferindo igualmente na qualidade do sono. No caso do sexo masculino, é de salientar que mesmo com restrições ligeiras da ingestão de hidratos de carbono a razão testosterona/cortisol diminui, favorecendo a acumulação de gordura abdominal.
Por outro lado, tendo em conta que o armazenamento de glicogénio no músculo se faz à custa de 3-4 gramas de água, excluir todos os hidratos de carbono da dieta provoca uma diminuição brusca no peso, interferindo também na composição corporal do indivíduo. Ou seja, em contexto de uma privação energética, o ambiente hormonal anabólico fica deprimido, comprometendo a quantidade de massa muscular.
No equilibrar é que está o ganho
A alimentação deve ser o mais equilibrada possível, isto é, capaz de fornecer a quantidade necessária de macro e micronutrientes. Como referido, os hidratos de carbono desempenham uma função essencialmente energética, mas não devemos desprezar o seu contributo na formação dos ácidos nucleicos através da ribose e desoxirribose. Por outro lado, a proteína tem várias funções, das quais salientamos a função plástica (como, por exemplo, a formação celular) e biorreguladora (as enzimas e algumas hormonas, como a insulina, são de natureza proteica). No entanto, quando a proteína é mobilizada para a formação de glicose, deixa de desempenhar a função plástica.
E as “gordurinhas”?
Por último, mas não menos importante, a gordura contribui com o seu potencial energético e de termorregulação, sendo também o veículo para as vitaminas lipossolúveis e elemento crucial na produção hormonal.
Atualmente, é sabido que a qualidade da gordura é mais importante do que a sua quantidade, salvaguardando a necessidade de bom senso na altura das recomendações. Os PUFAS (como os ácidos gordos ómega-3 e ómega-6) e os MUFAS (como o ómega-9 presente no azeite) apresentam benefícios ao nível da saúde cardiovascular, amplamente descritos na literatura científica.
O que comer, afinal?
EPm suma, a evidência sugere que se opte por cereais e massas integrais ao invés do pão branco, alimentos açucarados e farinhas refinadas, uma vez que conservam um maior valor nutricional e, por conterem mais fibra, contribuem para uma maior saciedade. Os legumes, pelo baixo teor em hidratos de carbono, e as frutas, que contêm frutose, também são aconselhados. E por muito que as nossas pupilas gustativas se queixem, a fast-food não está recomendada.
A ingestão de alimentos fornecedores de hidratos de carbono devem ser distribuída de forma equilibrada pelas refeições diárias, sempre de acordo com as necessidades de cada indivíduo.
Por outro lado, o equilíbrio energético baseia-se na ingestão equitativa do gasto, sendo que a absorção também não se faz de igual forma em todas as pessoas e para todos os alimentos. A palavra chave é mesmo o equilíbrio.
“Food is your body’s fuel. Without fuel, your body wants to shut down”.
Ken Hill
Este artigo teve a colaboração de Cláudia Salgado, licenciada em Nutrição pela Universidade Católica Portuguesa.
Ótimo trabalho sobre a boa almentação/