E se pudesses comer gelados fluorescentes?

Há gelados que poderiam surgir num menu gourmet de um filme de ficção científica, de tão bizarros que são. Dignos de serem comidos por seres alienígenas, surgem novos gelados, altamente científicos, que nos porão a boca a salivar… E a brilhar.

Com o tempo a arrefecer cada vez mais, as saudades do Verão e dos seus gelados fresquinhos aumentam. Se gostas destas delícias frias, aventura-te com a FRONTAL no mundo “brilhante” dos gelados alternativos.

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Gelados Fluorescentes

Comer um gelado fluorescente traz toda uma série de vantagens. Além de ser desmedidamente hi-tech e futurista, é uma boa opção para uma degustação em ambientes escuros com luzes fluorescentes, tais como cinemas.

A companhia de arte culinária Bompas and Parr foi a responsável por dar um tom mais alienígena aos Cornettos de menta, em Agosto deste ano no Reino Unido, durante a estreia de Guerra Mundial Z. Apesar da receita para estes gelados permanecer no segredo dos Deuses, podemos certamente afirmar que estes gelados possuem uma substância inócua fluorescente que emite luz quando estimulada com luz ultravioleta, como se consegue ver no vídeo promocional da marca.

Infelizmente, não se perspetiva que este tipo de gelado venha a ser comercializado em Portugal nos próximos tempos, mas não há dúvidas que a moda das “refeições fluorescentes” veio para ficar. O projecto Glowing Sushi Cooking Show mostra-nos como a cozinha pode ser um verdadeiro laboratório biotecnológico, recorrendo a produtos GloFish®. Desde 2003 que esta marca desenvolve peixes-zebra fluorescentes, geneticamente modificados, que atualmente são vendidos como ornamentos ou produtos alimentares. Estes peixes-zebra têm no seu DNA modificado genes que codificam proteínas fluorescentes de cor verde, amarela e vermelha.

Apesar de ainda nos parecer novidade, a história destes peixes-zebra tem mais de 10 anos. Em 1999, cientistas da Universidade Nacional de Singapura começaram a trabalhar com estes peixes e com proteínas fluorescentes, na tentativa de criar um peixe-mutante que brilhasse na presença de químicos tóxicos no seu habitat natural. A ideia, em prol da ciência e da preservação das espécies, acabou… no tacho.

Estreando-se novos produtos alimentares na culinária, surgem também novas regras de confeção. Estes peixes-zebra não podem ser cozinhados, uma vez que as proteínas que lhe atribuem a fluorescência acabarão por desnaturar com o aumento da temperatura. Por essa razão, estes peixes são apenas utilizados para confecionar sushi. Além disso, há que repensar todo o controlo de qualidade destes alimentos, tendo em conta o seu genoma modificado e o propósito com que foram criados.

Gelados que Brilham no Escuro

O gelado que brilha no escuro é uma invenção que foi trazida ao mundo no passado Dia das Bruxas e que promete revolucionar o mundo dos gelados. Criado pelo cientista culinário Charlie Harry Francis e comercializado pela sua empresa Lick Me, I’m Delicious, este gelado contém uma proteína sintética, derivada da proteína luminescente da alforreca, que lhe atribui a característica de brilhar a baixa luminosidade. A reação ocorre de uma maneira, no mínimo, original – basta que o guloso lamba o gelado para que as proteínas, ativadas por cálcio, reajam e comecem a emitir luz, devido à diferença entre o pH ácido da boca e o pH neutro do gelado. Quanto mais se lambe, mais o gelado brilha. O autor garante que não há qualquer perigo em consumir este gelado: ele próprio serviu de cobaia e nega quaisquer efeitos secundários. Sabe-se que existe outro autor desta invenção, um cientista chinês, que optou por manter o anonimato.

Apesar de altamente apetecível, o preço a pagar por esta “iguaria” é tudo menos agradável: 167 euros é quanto um curioso terá de desembolsar para poder provar uma bola de gelado que brilha no escuro. O preço exorbitante desta sobremesa deve-se ao facto de, como muitas vezes acontece em Ciência, a matéria-prima desta experiência – neste caso, a alforreca – ser extremamente cara. Para os vegetarianos e pessoas de paladar mais sensível, existe uma outra versão deste gelado, que, ao invés de usar a dita proteína de alforreca, utiliza quinino do gim tónico. O resultado é um sorvete de gim tónico negro que brilha quando exposto a radiação ultravioleta. O mais atrativo desta modalidade é, certamente, um preço mais acessível.

Para saberes mais sobre estes gelados e o seu inventor, acede ao site da Lick Me, I’m Delicious.

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O mundo da culinária tem sido palco de novas revoluções da biotecnologia. Cozinhar um prato de arroz deixou de ser só arte – é ciência. A simplicidade de uma cozinha caseira deu lugar a laboratórios no meio de tachos e panelas, cada vez mais sofisticados. Não são só os utensílios que evoluem – também as matérias-primas vão mudando. Com os problemas inerentes à criação animal, ao abuso de antibióticos por parte das pecuárias e culturas piscícolas e ao sobre-abuso de conservantes e corantes artificiais, torna-se imprescindível, agora, mais do que nunca, ter atenção ao que comemos. Comer gelados luminosos pode parecer o menor dos nossos problemas, mas a confeção alimentar com produtos transgénicos continua a levantar fortes questões no foro da saúde.

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Joana Moniz Dionísio é uma aluna do 5º ano de Medicina na FCM-NOVA. Apesar de ter nascido em Lisboa, viveu durante toda a sua vida em Alcobaça, até regressar novamente à capital para ingressar no ensino superior. Vem de uma zona conhecida pela sua doçaria conventual, mas as suas paixões e hobbies ignoram por completo a culinária, indo desde a Medicina, Literatura e História Universal até temas como a Cultura Oriental e Música Clássica. É colaboradora da revista FRONTAL desde Março de 2013 e foi no também nos idos de Março do ano seguinte que se tornou editora da secção Cultura. Desde Novembro de 2014 que assegura a função de Editora-Geral da FRONTAL. A autora opta pelo Antigo Acordo Ortográfico.

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